quinta-feira, 22 de abril de 2010

GALÁCIA: RESUMO HISTÓRICO

Os Gálatas eram um povo celta da Antiguidade que habitava uma região montanhosa na Anatólia central, hoje na Turquia. O país era limitado em parte pela Capadócia, ao Leste, pela Bitínia e Ponto, ao Norte, pela Ásia Menor, ao Oeste, e pela Panfília, ao Sul. Situa-se num planalto entre os Montes Tauro, ao Sul, e os Montes da Paflagônia, ao Norte. Na sua parte norte-central, ficava a cidade de Ancira, agora chamada Ancara, capital da Turquia. Os romanos também chamavam a região de Gália do Oriente, em contraposição à Gália do Ocidente (França atual). Abaixo, mapa do século XV que retrata a Ásia Menor so século II a.C. Vê-se nele a Galatia (Galácia).


Os romanos chavam de galii ( gálios) os povos de ambas as regiões. Ao longo do tempo, para destinguir os habitantes destas regiões convencionou-se usar-se gaulês para o celta da Gália e gálata para o celta da Galácia. O termo gálata (vindo do grego) é uma derivação de keltai ou galli como eram chamados os celtas pelos gregos e pelos romanos. O termo ainda está presente até hoje em Istambul, no nome da Torre Gálata e do bairro de Galatasaray ("Jardim dos Gálatas" em turco), bem como do time de futebol de mesmo nome (Galatasaray SK). O nome próprio utilizado por todos os celtas era gal- ou kel- como mostram o nomes de suas línguas e os nomes dos povos celtas: Galli, Galatae, Galaici, Gaelige, Kel(toi), Galatai. Abaixo, guerreiros gauleses.
Por volta de 281 a.C., um grande número de gauleses (celtas da Gália), que os gregos chamavam de Galátai (daí o nome da região na Anatólia), migrou para o leste da Europa conduzidos por Breno. Abaixo, a migração dos keltoi ( celtas, gauleses, gálatas) para os Balcãs.

Breno invadiu a Grécia em 281 com um enorme contingente de guerra e foi rechaçado quando pretendia pilhar o templo de Apolo em Delfos. Ao mesmo tempo, outro grupo de homens, mulheres e crianças gaulesas que se separaram do grupo de Breno em 279 migrava para a Trácia sob a liderança de Comontório onde fundaram a cidade de Tylis. Outros liderados por Bolgios invadiram a Macedônia, mataram o soberano Ptolomeu Cerauno, mas foram posteriormente expulsos por Antígono Gônatas, o neto do diádoco (herdeiro de parte do império de Alexandre, o Grande) Antígono, o Caolho. Abaixo, cabeça de um guerreiro gálata num escudo de ouro trácio.
O grupo de Comontório se estabeleceu na Trácia. Eles aterrorizaram a região e exigiam altos tributos de Bizâncio. Enquanto isso do outro lado do Bósforo, o rei Nicomedes I da Bitínia luta contra seu irmão, Zipoetes II, que domina metade do país. Para derrotar seu irmão, Nicomedes convida aos gálatas, mediante várias promessas de benefícios, a cruzarem o Estreito do Bósforo e ajudá-lo contra seu irmão. As tribos dos Tectosages, dos Trocmos e dos Tolistobogios lideradas por Leonório e Lutário atravessaram o Estreito do Bósforo. Eram aproximadamente 10.000 homens de combate e igual número de mulheres e crianças. Nicomedes providencia para que os invasores atravessem para a Ásia e juntos derrotam e matam Zipoetes II. Nicomedes assumiu o controle de toda a Bitínia e sob seu reinado esta alcançou poder e prosperidade. Na Ásia, os Gálatas, grandes guerreiros, acabaram por atemorizar e pilhar a região. Eles possivelmente ajudaram Nicomedes contra Antíoco e por fim estabelecem-se no interior da Anatólia, pois em 278 a.C. foram atacados pelo rei selêucida Antíoco I Sóter que os derrotou com elefantes de guerra. Abaixo, imagem de guerreiro gálata. No entanto, não foram exterminados. Em vez disso, a migração levou ao estabelecimento de um território céltico duradouro na Anatólia central, que incluiu a parte oriental da Frígia antiga, um território que ficou conhecido como Galatia que em português verte-se em Galácia. Aí eles enfim instalaram-se, e foram fortalecidos por novas migrações do mesmo clã vindas da Europa. Essa nova leva atravessou rapidamente a Bitínia e sustentaram-se pilhando países vizinhos. A constituição do Estado dos Gálatas é descrita por Estrabão em sua Geografia: em conformidade com seu costume, cada tribo foi dividida em cantões, cada um governado por um chefe (tetrarca) do seu próprio cantão com um juiz subordinado, cujos poderes foram ilimitados exceto em casos do assassinato, que eram julgados por um conselho de 300 representando os doze cantões e reunido em um lugar sagrado, vinte milhas para sudoeste de Ancira ( atual Ankara), que provavelmente teria sido um bosque de carvalho sagrado, chamado Drynemeton (do celta drys nemeton, "santuário dos carvalhos"). Deixaram a população local de capadócios no controle das cidades e da maior parte da terra, a qual, porém, pagava tributos aos seus novos senhores, que formaram uma aristocracia militar e se mantiveram afastados em fazendas fortificadas, rodeadas de seus grupos.Abaixo, ilustração dos Gálatas atacando Pérgamo.

Esses celtas foram guerreiros respeitados no Mundo Antigo. Eles eram alugados como soldados mercenários, às vezes lutando de dois lados nas grandes batalhas destes tempos. As tribos gálatas vinham ameaçando os povos na Ásia Menor obrigando-os a pagar um tributo de proteção. Por fim, os gálatas tornaram-se aliados do príncipe selêucida rebelde Antíoco Hiérax (imagem a esquerda), que havia fundado um reino independente do Império Selêucida e contava com o apoio dos gálatas. O regente de Pérgamo, Eumenes I, só livrou sua cidade mediante o pagamento de tributos. Seu sucessor, Átalo I, no entanto recusou-se a pagar tributo aos gálatas. Em conseqüência, os gálatas atacaram Pérgamo. O exército de Pérgamo e as forças gálatas se enfrentaram nas imediações da nascente do rio Caico e Átalo ( imagem ao lado) saiu-se vitorioso. Devido a esta grande vitória, Átalo adota o epíteto grego de Sóter (salvador) e o título de basileus, rei. O significado dessa vitória foi tamanho que posteriormente se criou a lenda de uma profecia de que um filho do touro de Zeus derrotaria os gálatas e esse filho foi identificado com Átalo que teria feições bovinas. Na acrópole de Pérgamo foi erguida em comemoração da vitória um monumento triunfal que incluía uma famosa escultura chamada Gálata moribundo. O tema dos Gálatas derrotados permaneceu recorrente na arte helenística por um bom tempo. Abaixo, representação do monumento original.Antíoco Hiérax tentou derrotar o rei Átalo I, mas em vez disso, Átalo e as cidades helenísticas unidas sob seu estandarte infligiram várias derrotas severas a ele e aos gálatas, aproximadamente em 232 a.C., forçando estes a confinarem-se à região para a qual eles já tinham dado o seu nome. O direito dos Gálatas ao distrito foi formalmente reconhecido pelos reinos vizinhos. As três tribos gálatas permaneceram na região da seguinte forma:
Os Tectosages no centro, em redor com a sua capital Ancira;
Os Tolistobogios no oeste, em redor de Pessino como a sua cidade principal. Pessino era a cidade sagrada da deusa frígia Cibele;
Os Trocmos no leste, ao redor de Távio, sua cidade principal.
Cada território tribal foi dividido em quatro cantões ou tetrarquias. Cada um dos doze tetrarcas tinha sob si um juiz e um general. Um conselho da nação composta do tetrarcas e trezentos senadores era periodicamente mantido no Drynemeton, vinte milhas ao sudoeste de Ancira. Hábeis e temidos guerreiros, os gálatas são alugados por vários soberanos. Os Atálidas de Pérgamo empregaram os seus serviços nas guerras cada vez mais constantes na Ásia Menor bem como Antíoco III, o Grande na sua luta contra o rei egípcio Ptolomeu IV.
No início do 2º século a.C., os Gálatas mostraram-se aliados terríveis de Antíoco III, o Grande, o último rei selêucida que tentou recuperar a suserania greco-síria sobre a Ásia Menor, o que ocasionou a Guerra Romano-Síria (192 – 188 a.C.); mas depois da derrota de Antíoco III pelos Romanos, Roma voltou seus olhos firmemente contra os Gálatas, quando então ocorreu a Guerra Gálata: esta foi um conflito militar que se travou em 189 a. C. entre o povo gálata contra a República romana e seus aliados de Pérgamo. Abaixo a Galácia em 188 a.C. após a Guerra Gálata.

A guerra se deu principalmente nas terras da Galácia. Após a vitória República Romana sobre o Império Selêucida na Batalha de Magnésia (189 a.C.), o cônsul romano Cneu Mânlio Vulso iniciou uma campanha contra os gálatas justificando-a na suspeita de que estes haviam apoiado Antíoco III durante sua guerra contra Roma. O historiador romano Tito Lívio, no entanto, sugere que as reais razões de Vulso eram de se apossar das riquezas do povo gálata e afamar seu nome como grande militar. Mesmo sem o aval do Senado, Vulso iniciou uma campanha com o apoio de Eumenes II de Pérgamo ( que enviou seu irmão Átalo Fildadelfo com as tropas pergamenas) onde avançou até o interior da Galácia com a ajuda de guias fornecidos por Seleuco IV Filopátor, sucessor de Antíoco III. Os Romanos e aliados encontram a tribo gálata dos Tolistobogios e embora prepare-se para o conflito, Vulso procura fazer um tratado com Eposognato, um dos líderes dos Tectosages, o qual mantinha boas relações com Pérgamo. Eposognato aceita aliar-se aos romanos desde que estes não invadam suas terras e em troca ele procuraria trazer à aliança romana os demais líderes gálatas. Porém o acampamento romano foi atacado em Cubalo onde apesar das baixas, os romanos infligiram uma derrota aos atacantes. Eposognato envia uma mensageiro a Vulso dizendo que não conseguiu aliançar os demais gálatas à causa romana e que Vulso deveria se preparar para a guerra. Por fim, os Tectosages se aliaram aos Tolistobogios e os Trocmos e ocuparam o Monte Olimpo e arredores onde se travou a Batalha do Monte Olimpo onde os romanos e aliados obtiveram uma esmagadora vitória sobre os gálatas que perderam cerca de 10.000 homens e cerca de 40.000 foram capturados. Os despojos foram grandes. Acima, estátua de guerreiro gálata suicidando-se após matar a esposa para não cair nas mãos dos inimigois. Após a vitória no Monte Olimpo, os tectosages procuraram negociar a paz com os romanos propondo uma conferência em Ancira. No entanto, isso era um estratagema para ganhar tempo e conseguir fazer com que as mulheres e crianças gálatas atravessassem o rio Hális e tivessem tempo de atacar a Vulso quando sua ida a Ancira. Após um ataque gálata frustrado, os Romanos investem contra os gálatas impondo-lhes tremenda derrota; muitos fogem para evitar um massacre e o exército romano-pergameno os persegue até seu acampamento onde os gálatas são dizimados. Poucos conseguem passar para a outra margem do Hális onde estavam as mulheres e crianças. Esse episódio ficou conhecido comoa Batalha de Ancira. Com as derrotas de Olimpo e Ancira, os Gálatas foram forçados a buscar a paz com os romanos. Abaixo, estátuas de Gálatas derrotados provenientes de Nápoles. Tão temidos eram os gálatas como guerreiros, que derrotá-los merecia ser comemorado com monumentos. O tema da derrota dos gálatas foi marcante na arte estatutária greco-romana.
A campanha beneficiou Vulso e suas legiões à custa dos tesouros que os Gálatas tinham acumulado durante as suas conquistas na Ásia Menor. A Galácia foi daqui em diante dominada por Roma através líderes locais e teve seu território diminuído pela expansão do Reino do Ponto. Eles foram finalmente libertados pelas Guerras Mitridáticas (República Romana versus Mitrídates VI Eupátor do Ponto), durante as quais eles apoiaram Roma.
No acordo de 64 a.C. a Galácia tornou-se um Estado cliente de Roma, a velha constituição desapareceu, e três chefes (inadequadamente chamados de “tetrarcas”) foram designados, um para cada tribo. Mas este acordo logo deu ocasião para a ambição de um desses tetrarcas, Dejótaro, o contemporâneo de Cícero e Júlio César, que se fez o senhor das outras duas tetrarquias e foi finalmente reconhecido pelos Romanos como rei da Galácia. Foi sucedido por Brogítaro.
Quando da morte do terceiro rei gálata, Amintas, em 25 a.C., a Galácia foi incorporada por César Augusto ao Império Romano, tornando-se uma província romana a qual foi ampliada para incluir partes da Licaônia, da Pisídia, da Paflagônia, do Ponto e da Frígia. Abaixo, a província romana da Galácia.

Perto da capital da Galácia, Ancira, Pilamenes, o herdeiro do rei, reedificou um templo da deusa frígia Men para venerar Augusto (o célebre Monumentum Ancyranum, imagem abaixo), como um sinal da fidelidade. Nas paredes deste templo na Galácia foi conservada para a modernidade a fonte principal do Res Gestae (Coisas da Gestão) de Augusto. Poucas províncias mostraram-se tão leais a Roma.

Os Gálatas praticavam uma forma de politeísmo romano-céltico, comum em outras terras célticas.
Eles ainda falavam sua língua gálata, de origem celta, no tempo de Jerônimo (347–420 d.C.), o qual descreveu que os gálatas de Ancira e o povo de Augusta Treverorum ( atualmente Trier, localizada hoje na Renânia alemã) falavam uma língua muito semelhante.
Foi na província da Galácia ampliada que o apóstolo Paulo e outros missionários cristãos evangelizaram diversas cidades no século I d.C., tais como Icônio, Listra e Derbe e nas quais, organizaram comunidades cristãs locais. Paulo escreveu uma epístola às comunidades cristãs da Galácia, a Epístola aos Gálatas, a qual ressalta a primazia da graça sobre a lei da Antiga Aliança. Abaixo, cidades da província da Galácia (mas não cidades gálatas) visitadas pelo Apóstolo Paulo.


FONTES:
http://es.wikipedia.org/wiki/Galacia
http://pt.wikipedia.org/wiki/Gal%C3%A1cia
http://ca.wikipedia.org/wiki/Gal%C3%A0cia
http://osreisdabitinia.blogspot.com/2009/02/nicomedes-i-278-255-ac.html
http://es.wikipedia.org/wiki/Guerra_G%C3%A1lata
http://www.romanarmytalk.com

13 comentários:

  1. Amado do Senhor.

    Estudo Paulo, suas cartas e, principalmente, a Igreja em seus primórdios. Muito me admira que, diante do estudo que você propõe ao apresentar dados históricos tão ricos e consistentes, ninguém tenha feito qualquer comentário ou indagação.

    Faço-o eu, então: muito rico o material que o irmão dispõe para enriquecer o estudo da Palavra. Glórias a Deus por sua disposição em abençoar ensinando.

    Graça e Paz

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  2. Caro Paulo, obrigado por suas gentis palavras. Embora escreva por prazer, por hobby, muito me alegra que meus escritos contribuam de alguma forma para a vida das pessoas. Que Deus o abençoe ricamente.

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  3. Amado Joalsemar, quero parabeniza-lo pelo artigo...me foi de grande valia.
    Sou seminarista e precisava dessas informações para compor um estudo das cartas paulinas.
    Continue servindo com toda essa sabedoria que Deus te deu.
    Um forte abraço, em Cristo

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    1. Obrigado, Luiz. Fico feliz por ter contribuído. Que Deus o abençoe ricamente.

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  4. Muito bom o artigo, deu para esclarecer sobre o local e sobre o povo Gálata e sua origem.
    Graça e Paz no Senhor.

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    1. Este comentário foi removido pelo autor.

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    2. Obrigado. Fico feliz por ter contribuído. Que Deus o abençoe ricamente.

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  5. Joalsemar, graça e paz! Gostei de seu texto, de leitura elucidativa, sintética e fácil. Tenho particular interesse no tema, e coincidentemente nesse momento elaboro tese que passa pela região da Galícia, pelo galego - seu idioma, e temas afins. Textos que permitam o link entre os Gálatas e à Galícia podem ser interessantes, sim. Caso tenha mais textos, por favor, envie pelo josias.nunes@hotmail.com Parabéns pelo esforço. Abraços!

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  6. Prezado Joalsemar, belo texto. Gostei da linguagem, do poder de síntese e da abrangência. Tenho particular interesse em textos que aproximem os Gálatas da região da Galícia, e do idioma galego. Caso tenha esse material, mande pelo josias.nunes@hotmail.com Parabéns pelo texto, abraços!

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    1. Obrigado. Fico feliz por ter contribuído. Que Deus o abençoe ricamente.

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  7. Que maravilha! Amei o blog! A única coisa que saibia dos gálatas seriam os mais famosos hoje, os guerreiros celtas asterix e obelix, dos quadrinhos. Mas se trata de uma história riquíssima e como o amor de Deus e a filiação de Deus por meio da fé se estendeu a todos! Imagino que sua história como guerreiros mercenários, em nada agradava a aparência religiosa judaica, mas estava repleta de poder de Deus e atitudes íntegras, nos auxiliando a compreender melhor o texto bíblico. Muito obrigada!!!

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    1. Obrigado, Juliana. Fico feliz por ter contribuído. Que Deus a abençoe ricamente.

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